Por Cristiane Faustino
Coari/AM - petróleo: “Em janeiro de 2014 é revelado ao Brasil um sofisticado e brutal esquema de exploração e violência sexual consolidado há anos no interior do estado do Amazonas”. (Marcia Acioli – Adital . Fev.2014)
Caso São Gabriel das Cachoeiras/AM - turismo e pressão pela mineração: “na fronteira do Brasil com a Colômbia, um homem branco compra a virgindade de uma menina indígena com aparelho de celular, R$ 20, peça de roupa de marca e até com uma caixa de bombons”. Kátia Brasil, enviada especial da Folha a São Gabriel da Cachoeira, AM. Nov.2012
Altamira e Outras/PA - Usina de Belo monte: “(...) foi verificado um aumento de 18,5% no número de crimes sexuais nos 11 municípios próximos ao empreendimento. Em Altamira, que é o município e mais atingido, o aumento foi de 75%. A população da cidade aumentou de 99 mil para 145 mil habitantes em dois anos (2010/2011). Atualmente, 20 mil operários trabalham na construção de Belo Monte”. (CombateRacismoAmbiental, Março/2013)
Usinas Santo Antônio e Jirau/ RO: “os partos de meninas entre 10 e 19 anos já representam 28% do total de procedimentos na maternidade pública de Porto Velho. Além disso, na distrito de Jaci Paraná, localizada a 90 Km de Porto Velho (RO), houve um aumento de 208% nos casos de estupro em 2007 (ano do início das obras)”. (ibidem)
Duque de Caxias/RJ - petróleo: “É visível o crescimento do mercado do sexo onde a prostituição e a exploração sexual emergem e/ou se agravam como “possibilidades” subordinada e marginalizada de inclusão das mulheres e meninas no entorno da cadeia produtiva do petróleo. Como consequência, a gravidez na adolescência e o nascimento ¨dos filhos do petróleo¨ que nunca chegam a conhecer seus pais, é também outra realidade (SALLES, 2012). (Plataforma Dhesca, 2013).
Bom Jesus das Selvas/MA - mineração: Desde a chegada dos 2 mil homens da empresa na cidade de 25 mil habitantes, houve um aumento dos casos de prostituição e exploração sexual infantil, aponta Mirian Alves Feitosa, coordenadora do Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos do município. As vítimas, explica, “são adolescentes de baixa renda e que não têm estrutura familiar. Elas se prostituem em troca de roupas, sapatos. Vez ou outra recebem dinheiro, as quantias como R$ 30, R$ 50”. De acordo com o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010, 50% da população do município vive em condições de pobreza extrema, ou seja, com menos de R$ 70 ao mês. (Revista Caros Amigos, Dezembro,2012).
Litoral do Ceará: Jovens de comunidades impactadas pela indústria de eólicas denunciam a exploração sexual de mulheres, através da peça teatral “Filhos dos Ventos”.
Algumas perguntas e reflexões que não podem calar
Por que as mulheres e meninas são grupos vulnerabilizados nos impactos sociais e ambientais do desenvolvimento brasileiro e mais especificamente no que se refere a exploração e ao abuso sexual no interior ou na “aba” dos projetos desenvolvimentistas? Teria o trabalho sexual das mulheres o mesmo valor que os empregos gerados para os homens? A cultura do estupro segue a modernização do Brasil? E quem perde com isso?
Por que as mulheres e meninas são grupos vulnerabilizados nos impactos sociais e ambientais do desenvolvimento brasileiro e mais especificamente no que se refere a exploração e ao abuso sexual no interior ou na “aba” dos projetos desenvolvimentistas? Teria o trabalho sexual das mulheres o mesmo valor que os empregos gerados para os homens? A cultura do estupro segue a modernização do Brasil? E quem perde com isso?
O que me leva a refletir sobre as desigualdades entre homens e mulheres e em como tais desigualdades se refazem e se agravam como consequências de um modelo de desenvolvimento terrivelmente violento para as populações locais, a natureza e os bens comuns. No caso, específico da exploração de nossa sexualidade que viabiliza o bem estar sexual dos trabalhadores de todos os níveis das hierarquias, das autoridades públicas e religiosas, refletem os lugares históricos em que fomos situadas pela violência e privilégios patriarcais, onde nosso corpo e nossa sexualidade são vistos e tratados como destino e, se não única, como possibilidade real de “ganhar a vida”, ou perdê-la. Essa visão e pratica sobre as mulheres também é fator que historicamente nos distanciou das tarefas social, econômica, política e culturalmente mais reconhecidas e isso tem consequências reais, agravadas na vida das mulheres negras e indígenas, quando as políticas públicas e a iniciativa privada repaginam o Brasil Colonial e facilitam o exercício de crimes contra as mulheres e outros desprivilegiados:
Mas compreender as coisas desse modo, não deve implicar em simplesmente nos colocar no lugar de vítimas, primeira “tentação”, que às vezes só serve para obscurecer as questões. Entretanto, não se deve perder de vista o quanto o abuso sexual de crianças e adolescentes são violências profundas e influenciam no como se tornam mulheres e na forma e condições de decidirem sobre o exercício de sua sexualidade. Não custa lembrar que boa parte das meninas que comercializam seu sexo carregam histórias de violências praticadas pelos entes “queridos” e negligenciadas por quem as deveria protegê-las.
Nesse contexto, é preciso traçar pensamentos e estratégias que permitam a compreensão justa e os enfrentamentos necessários das desigualdades e perversidades que perpassam a questão. Pois, com todas as polêmicas e diferenças de entendimento que se possa ter sobre o assunto, é razoável supor que não é justo que para as mulheres estejam sempre recolocados os lugares da sensualidade e sexualidade como condicionamentos de destino. Ademais, fato é que a exploração sexual de meninas ou a prostituição das mulheres, nunca foram lugares que nos privilegiam dentro das estruturas de poder e/ou acesso à riqueza.
Partir desse entendimento não nos impede de reconhecer as liberdades individuais das mulheres, nem tampouco de reconhecer, legitimar e defender os legítimos direitos das prostitutas. O mais importante talvez seja romper com as perspectivas economicistas, moralistas e hipócritas que invisibilizam os consumidores de sexo, nos impedem de compreender as relações entre desenvolvimento e violências, as estratégias de sobrevivência das mulheres empobrecidas e mesmo das escolhas das não empobrecidas. Tais perspectivas tendem a culpabilizar as vitimas reais e a negligenciar os sofrimentos e dores de quem sofre, sem amparo, sem reconhecimento, sem espaço de escuta e acolhimento, e a fragilizar as possibilidades de construção de sujeitos políticos.
No submundo do desenvolvimento, a exploração da sexualidade das mulheres, a perversão e a pornografia costumam estar associadas a outras ilicitudes como a pedofilia, o tráfico de drogas, de armas e de pessoas. Constrói-se, assim, um mundo de desamparo e desumanização das relações na luta pela sobrevivência. A estigmatização, a discriminação e a morte física e simbólica são preocupações de, quase, ninguém. Na modernidade do sec. XXI, mulheres e meninas, negras e indígenas continuam sendo o lugar mais “penetrado” do patriarcado racista que “emoldura” o desenvolvimento capitalista e a dominação do Norte sobre o Sul. (FAUSTINO & FURTADO, Revista Não Vale, II Edição;46),
Nesse contexto, é preciso traçar pensamentos e estratégias que permitam a compreensão justa e os enfrentamentos necessários das desigualdades e perversidades que perpassam a questão. Pois, com todas as polêmicas e diferenças de entendimento que se possa ter sobre o assunto, é razoável supor que não é justo que para as mulheres estejam sempre recolocados os lugares da sensualidade e sexualidade como condicionamentos de destino. Ademais, fato é que a exploração sexual de meninas ou a prostituição das mulheres, nunca foram lugares que nos privilegiam dentro das estruturas de poder e/ou acesso à riqueza.
Partir desse entendimento não nos impede de reconhecer as liberdades individuais das mulheres, nem tampouco de reconhecer, legitimar e defender os legítimos direitos das prostitutas. O mais importante talvez seja romper com as perspectivas economicistas, moralistas e hipócritas que invisibilizam os consumidores de sexo, nos impedem de compreender as relações entre desenvolvimento e violências, as estratégias de sobrevivência das mulheres empobrecidas e mesmo das escolhas das não empobrecidas. Tais perspectivas tendem a culpabilizar as vitimas reais e a negligenciar os sofrimentos e dores de quem sofre, sem amparo, sem reconhecimento, sem espaço de escuta e acolhimento, e a fragilizar as possibilidades de construção de sujeitos políticos.
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